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Foto do escritorArthur Gadelha

Amor de Mãe #05: Pandemia entra em jogo

Após quase um ano completo de interrupção devido a pandemia da Covid-19, novela de Manuela Dias volta sem tempo a perder

Chega a ser até irônico que Amor de Mãe tenha sido impedida ano passado por um vírus e retorne, em 2021, com a mesma pandemia em estágio mais avançado pela gestão caótica e negligente da esfera federal diante da situação que fica dando voltas em si. Na segunda-feira, dia do primeiro episódio da segunda fase, foram 1.855 mortes registradas no mesmo dia, o 17º consecutivo com a maior média de mortes desde o começo da pandemia. Diante dessa condição de guerra, a equipe de Manuela Dias começou acertando, na intenção e na prática, ao inserir a pandemia no contexto de seus personagens, nas linhas do roteiro, na direção de arte e até mesmo na montagem.



Vida de distância

A introdução do primeiro capítulo sob narração de Lázaro Ramos deixa claro que o mundo de Lurdes, Thelma e Vitória é o mesmo desse nosso: uma vida de reclusão, isolamento e novos cuidados. Em seguida, a pandemia se confirma em elementos naturalmente atravessados nas histórias, seja Lurdes representando aquela nossa avó ou tia que ameaça sair de casa pra ir no mercado, as máscaras como adereços das cenas urbanas, ou os comentários "discretos" de personagens que passaram pela doença, como Lídia e Magno. As conversas à distância, mediadas por "whatsapp" e reuniões de zoom, soam como uma solução muito bem resolvida - não perde timing e nem soa alienígena. Muito, também, pela performance naturalmente convincente das atrizes. De conversas simples, como a de Thelma e Lurdes sobre seus filhos quererem se mudar em plena pandemia, à cenas dramáticas, como na revelação da "morte" de Domênico, a ausência da fisicalidade não incomoda pois injeta ainda mais solidão nesse drama.



Tom da Vilania

Aquela história romântica de que "o vilão é a vida" caiu por terra há muito tempo. Manuela e o diretor José Luiz Villamarim não conseguiram sustentar junto ao público a ideia que nasceu com tanta dedicação no primeiro mês da novela, lá em novembro de 2019. A mãe que precisa acobertar um assassinato do filho, a advogada de bilionário que tem um drama pessoal empático sobre maternidade, a mãe-coruja tão bondosa que acaba encurralando o próprio filho - essas contradições levaram para a tela a crueldade de uma vida que não combina com dicotomias. Bom, mas isso já se foi, vamos voltar para o que Amor de Mãe é hoje.


Desde que Thelma deixou de ser a mãe receosa para uma assassina fria e calculista, sua personagem vive ali entre atuação contida e explosiva, um limiar tão específico que aparentemente só Adriana Esteves parece capaz atualmente na teledramaturgia brasileira. Se não fosse ela, Thelma soaria como uma personagem frágil e sem identidade há muito tempo. A internet vive a comparando com a Carminha, de Avenida Brasil, mas me parece uma percepção muito injusta, mais pautada pela insistência do meme do que propriamente por uma visão individual. A vilania de Thelma, e a forma como ela mesma trata isso, é exclusiva.


A sequência em que Jane revela para Thelma ter descoberto seu assassinato, apesar da fragilidade do roteiro que objetiva tanto o destino previsível e pouco justificável narrativamente, é uma pérola incrível de performances pois o combate de atuações contidas entre Adriana e Isabel Teixeira (Jane) é impressionante. Com a câmera de Walter Carvalho quase invadindo seus rostos, a discussão silenciosa depende de um medo que está nos detalhes: no rosto trêmulo, nos olhos que custam a lacrimejar, na voz pautada pela tensão. Adriana já tinha feito cenas semelhantes na novela tão incríveis quanto, então o impacto surpreendente aqui foi de Isabel. Eletrizante.


OBS: Com a cena da morte de Jane, impossível não se recordar da primeira temporada de House of Cards, quando Francis Underwood assassina o congressista Peter Russo de forma tal qual na sequência de Amor de Mãe... Manuela andou assistindo Netflix, hein?


Expectativas

Embora sem tantas surpresas, o retorno de Amor de Mãe cumpriu um bom papel de reintroduzir o desenvolvimento da história e fazê-la caminhar tanto tempo depois sem parecer outra novela. O pouco que vimos das personagens traz conforto e conflito na mesma medida já que eles, felizmente, não mudaram nada. A promessa é que essa segunda fase seja composta por 23 episódios (ou filmes, como Adriana disse em entrevista a Ana Maria Braga), e a esperança é que eles possam seguir um mesmo projeto dramático - tanto de narrativa e estética, quanto de destino. Afinal, a essa altura do campeonato, sinto que essa trama não sobreviveria a mais uma mutação da sua essência.

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