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Foto do escritorArthur Gadelha

A beleza de "West Side Story" está na homenagem sem riscos

CRÍTICA Chegando nos 45 do segundo tempo com divulgação atrofiada, primeiro musical de Steven Spielberg é mesmo tudo o que a memória de Hollywood precisava

Quando La La Land chegou ao mundo, Damien Chazelle foi alçado a um lugar de admiração súbita por ter traduzido com graça o respeito que a arte estadunidense tem por seus musicais, da hegemonia da Broadway às cenografias ilimitadas das telas de cinema. Mesmo distante dos tempos áureos, parece mesmo é que esse gênero encontrou sua atemporalidade na estrutura comercial do cinema: pode vir a qualquer hora. Se Os Miseráveis (2012) se tornou a sensação isolada do seu ano, em 2021 são mais musicais do que eu lembre aqui de cabeça; Dear Evan Hansen, Em Um Bairro de Nova York e Tick, Tick... Boom!, para citar alguns recentes.


No caso de West Side Story, remake de Steven Spielberg sobre obra de 1961 (aqui deste então chamado de Amor, Sublime Amor), ganha destaque seu inevitável anacronismo - afinal, recriar um enredo tal qual 60 anos depois para percebê-lo contemporâneo nessa era Trump nos EUA (e no mundo), é a representação de um assombro que não deveríamos termos nos acostumado. Ao fim da experiência de encarar a mesma jornada, essa parece ser uma das poucas razões honestas levadas em consideração para essa nova versão.


Para enxertar essa dinâmica, boas ideias: renovar o elenco numa medida que honre as mudanças do tempo, mas sem ofender até as partes frágeis de seu original - ou seja, ao mesmo tempo em que a paixão sublime continua sem substância na entrega do casal (especialmente por Ansel Elgort conseguir ser ainda menos carismático que Richard Beymer), outras presenças ganham emoções quase que originais em medida de comparação: Ariana DeBose criando uma Anita muito mais radiante (somada a Rita Moreno que volta com outro destaque) e Mike Faist dando a Riff uma personalidade mais obcecada e envolvente.


Esses dois, Ariana e Mike, deixam ainda mais bonita à dedicação dessa fábula aos movimentos, aos estalos dos calçados e dedos, ao som das roupas cortando o ar, uma história que sempre foi mais de dança do que propriamente de música. Outros também brilham, claro, como Rachel Zegler e David Alvarez, mas estes muito mais aprisionados à homenagem de suas origens.


Mike Faist e Ansel Elgort, num combate de presença nada justo

Nesse jogo, cada um de um lado, é claro que ressalta a intenção de atualizar a conversa sobre racismo e imigração também no ponto de vista prático, já que agora os atores porto-riquenhos não são mais aqueles brancos pintados dos anos 1960. Na experiência internacional do filme, porém, essa discussão é ameaçada por uma negligência inacreditável: sim, Spielberg não quis pôr legenda nas falas e canções em espanhol porque seria "desrespeitoso" num país que tem a segunda maior população de língua espanhola do mundo, mas e nos outros países?


No Brasil, além das legendas das canções em inglês já decepcionarem pelo descompromisso com as letras originais, as falas em espanhol são deixadas de lado, assim como as falas em italiano são subtraídas em Ford vs Ferrari (2019) porque a trama os constrói como vilões. Claro que aqui essa não é a intenção, e a narrativa de Spielberg põe essas palavras e sons à margem, quase no subtexto, "sem comprometer" o entendimento geral da história. Mas deixar esses personagens sem nossa compreensão soa só como se o que eles falam não importa ou que é nós que não importamos - na "melhor" das hipóteses, o que posso supor é que a culpa seja "só" do mal planejamento de distribuição feito às pressas, visto que o filme entrou em cartaz no Brasil sem qualquer campanha para durar apenas uma semana em alguns cinemas por conta da aterrisagem onipresente do novo Homem Aranha.


Apesar desses engasgos alheios, porém, West Side Story (Amor Sublime Amor, 2021) é mesmo um bom filme - daqueles para se assistir exatamente num fim de ano e se permitir às deliciosas ilusões de um amor incondicional. Spielberg, veterano ideal para guiar esse projeto, imprime ali sua criatividade de forma modesta nas curtas reinvenções de imagem e dramaturgia, mudando coisas de lugar ou apenas as pondo em maior evidência. Para não correr riscos, o hoje 20th Century Studios faz um filme charmoso, mas estrategicamente imobilizado pelos protocolos de uma indústria que se retroalimenta em momentos de "crise". Se ao longo das quase 2h30m vai soando como um filme-serviço apenas muito empolgado na balança de nostalgia e novos valores, pelo menos a viagem deixa as coisas bem divididas: a consistência da breve crítica social no presente e as revoluções visuais todas no passado. Tinha como ser diferente?

 
 

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